Decerto que já se perguntou como será a embalagem do futuro. Então, como é que se conseguirá adaptar às expectativas dos consumidores, à legislação atual e futura e, sobretudo, às necessárias considerações ambientais que giram em torno das nossas sociedades?
De forma a sermos projetados neste futuro, entrevistámos Fabrice Peltier, designer e consultor de eco-design, tendo lançado o seu novo livro: The Packaging Revoution – First period: The Emergence of New Solutions.
Segundo o autor, é abordado o caminho que o levou a desenvolver as suas metodologias de eco-design e qual a sua visão das embalagens do futuro.
Em relação à sua primeira relação com embalagem, Fabrice aborda os seus primeiros passos, explicando que tudo começou na sua infância. “Há mais de 50 anos, era uma criança que vivia no campo, entre Lozère e Ardèche. Nessas pequenas aldeias francesas, o destino do lixo era claro: muitas vezes acabava abandonado em plena rua, na saída da cidade.” Quando tinha apenas dez anos, os seus irmãos e ele fundaram uma associação que visava a preservação da natureza. Aos fins de semana, esvaziavam o lixo: foi lá que teve o seu primeiro contato com as embalagens. Na altura, ainda não tinha plena consciência do impacto ambiental: era só lixo, e pensava mais propriamente em como não se magoar, por exemplo, com as latas enferrujadas e os cacos de vidro.
Desse modo, foi confrontado com uma educação e um modo de vida próximo da natureza, e foi sensibilizado para a proteção do ambiente. Esta foi, portanto, uma sensibilidade e um estilo de vida que se desenvolveu muito cedo na sua vida.
Foi essa infância que o levou ao design de embalagens?
Segundo Fabrice, na verdade não foi. Ganhou o seu primeiro concurso de desenho na década de 1970: foi um concurso organizado pela UNESCO para promover a proteção ambiental, segundo os primeiros desastres ecológicos. Assim, foi essa atração pelo desenho que o levou a estudar impressão e design gráfico na École Estienne de Paris. Ao passo que se tornou imediatamente um designer gráfico freelance. Além disso, foi aí que começou também a ver a embalagem do ponto de vista profissional: um dos seus primeiros clientes pediu-lhe para desenvolver uma embalagem e outros materiais gráficos. Foi, então, que percebeu que a embalagem que identificou como lixo quando era criança, estava a ser criada por ele.
Como mudou para embalagens mais ecológicas?
Sobretudo, no início da década de 1990, as pessoas começaram a falar na reciclagem das embalagens. Ao mesmo tempo, nasceu uma ecologia política, mas pouco se interessou por ela, pois o meio ambiente era para ele um valor bastante humanista. Assim que a Eco-Embalagem foi criada, teve interesse pela reciclagem e tornou-se num grande divulgador dela. Também tentou espalhar rapidamente a mensagem de que os designers de embalagens são responsáveis pelo impacto ambiental dos seus projetos e que, se não fizessem nada, seriam culpados. Paralelamente ao seu trabalho como designer, escreve artigos, nomeadamente para a Emballage Magazine, mas também livros. Há cerca de dez anos, colocou em prática uma ideia que já tinha há muito tempo: tornou-se num consultor de embalagens. Percebeu assim que, como designer, tudo o que estava a promover em termos de eco-design não era levado a sério, pelos seus clientes. Para ajudar as empresas a fazer melhor, teve que assumir uma função de ‘consultor’, e não uma função de ‘criativo’. Acima de tudo, nos dias de hoje, ensina aos seus clientes a sua metodologia de eco-design; e, ao mesmo tempo, cuida da gestão dos resíduos na sua aldeia de Combloux. Atualmente, está bastante envolvido no mundo das embalagens e espera, verdadeiramente, contribuir para tornar as embalagens cada vez menos poluentes para o meio ambiente.
Como explica o retorno massivo das embalagens de papel e de cartão no uso comercial atual?
Segundo Fabrice, “não é tanto que as empresas estejam focadas nesse tipos de embalagens em grande escala. Na verdade, elas estão é a afastar-se principalmente do plástico. A consciência de que o plástico é prejudicial para o meio ambiente, advém principalmente do foco nos plásticos marinhos, que estão a invadir os nossos mares. Assim, esta noção aborda duas questões muito importantes para os humanos: a forma como o plástico afeta os animais e a forma como prejudica a saúde humana. A redução e a, consequente, eliminação do plástico, reforçada pela nova legislação, está a fazer com que as empresas passem a utilizar papel e cartão, para minimizar o consumo do plástico. No entanto, ainda há mais comunicação em torno dessas iniciativas de embalagens ecológicas, do que propriamente fatos concretos.
Acha que as embalagens de plástico desaparecerão completamente das práticas comerciais?
Para Fabrice, hoje em dia é bastante difícil, senão impossível, dispensar o uso do plástico. Antes de tudo, o plástico tornou-se indispensável nas nossas vidas e ainda não encontrámos nenhuma alternativa. Por exemplo, sem plástico, durante esta pandemia da Covid-19, seria bastante complicado utilizar recursos que não fossem fabricados em plástico. Ou seja: proteções, respiradores, entre outros.
Para voltar à embalagem, é preciso entender que o problema não é o plástico. O problema é antes o uso do plástico e, em particular, o de uso único. As empresas ainda perguntam muito sobre “como usar o plástico”, ao invés de “porquê usá-lo”. Isso leva-as a superproteger, embalar e consumir demasiado este tipo de material. Em suma, as embalagens de plástico têm tais capacidades de proteção e resistência (não necessariamente úteis), que acabam na natureza e ali ficam. Segundo o autor, o plástico não vai desaparecer, mas o seu uso precisa de ser totalmente repensado. Isto é: os fabricantes devem de se perguntar qual é a verdadeira necessidade de proteção dos seus produtos. Por exemplo, os envelopes com plástico de bolhas de ar serão mesmo necessários? Por outro lado, os consumidores também devem de se perguntar se realmente precisam dessa embalagem de plástico. Hoje, essa pergunta só é feita no momento em que mandamos para o lixo, a embalagem, mas deve de ser feita no momento da compra. Em conclusão: cabe, portanto, aos fabricantes, bem como aos consumidores, fazerem estas questões.
Quais acha que são as tendências das embalagens mais promissoras para o futuro?
No livro “A Revolução da Embalgem”, Fabrice afirma que essa revolução está a trazer várias tendências interessantes. Por exemplo, assistimos ao desenvolvimento de materiais renováveis (por exemplo, plásticos feitos de celulose) e materiais reciclados. As embalagens não recicláveis têm os dias contados e será impossível criar embalagens que não possam ser recicladas. Mas essa não é a base dessa revolução em si. As tendências que realmente irão revolucionar as embalagens são aquelas que acabam com a noção do uso único. A fim de que o objetivo deve de ser reinventar completamente a embalagem em torno da noção de uso múltiplo, de reutilização. No entanto, por outro lado, essa tendência da reutilização aborda os problemas dos novos métodos da distribuição. Embalagens descartáveis costumavam fazer sentido para as vendas em hipermercados, essencialmente, onde o consumidor se dirige ao produto. Agora é cada vez mais o produto que vai para o consumidor. É por isso que nos deparamos com o surgimento de alavancas que estão em linha com essa revolução: o desenvolvimento de materiais de origem renovável ou dos materiais reciclados. Em suma, as tendências mais promissoras não são as embalagens em si, mas as novas formas de acondicionamento, nas embalagens reutilizáveis.
O que vê como o principal impulso do próximo período da revolução da embalagem?
No ano corrente, será lançada a segunda parte do seu livro: terá o subtítulo Experimenting with New Models. Portanto, o segundo período desta revolução será experimentar algumas das soluções que são abordadas no primeiro livro, para ver quais precisam de ser desenvolvidas em grande escala. Experimentar modelos de reaproveitamento, novos modelos de embalagens, novos sistemas de distribuição, entre outros. Ao passo que isso requer tempo. Segundo Fabrice, sem dúvida que veremos que surgem novas soluções de embalagem, mas que agora estamos num ponto em que precisamos de testar e ver os resultados dessas soluções para escolher o que realmente funciona.
Se tivesse que descrever a embalagem do futuro em poucas palavras, como a descreveria?
A embalagem do futuro é caraterizada como:
• Reciclável;
• Reciclada (ou seja, feita de materiais reciclados);
• Leve
• Tendo a mesma funcionalidade que a embalagem de hoje.
No entanto, Fabrice gostaria de ir mais longe: a embalagem do futuro é simplesmente “a embalagem certa”: o material certo, a quantidade certa… Hoje, vivemos numa era de “excesso”: excesso de funcionalidade, excesso de embalagem , consumo excessivo, entre outros.
Que conselho daria a uma empresa que quer pensar no futuro das suas embalagens?
Em primeiro lugar, o autor realça que é fundamental parar de tomar decisões isoladas. É preciso colocar todos os departamentos da empresa em torno da mesma mesa e trabalharem todos juntos numa metodologia sólida. Mas, acima de tudo, é necessário fazermos a nossa reflexão com verdadeira convicção. Porque, se partirmos do princípio de que a embalagem eco-responsável é uma vantagem competitiva, que é uma imposição para o consumidor, ou que a lei exige de nós… necessariamente partimos de uma deficiência. Segundo o autor, “temos que seguir em frente com um compromisso real, o que permite que sejam tomadas as decisões certas.”
À pergunta, porque escolheu a CEO do Grupo RAJA para escrever o prefácio do seu livro, Fabrice afirma que já tinha planeado o lançamento do seu livro com dois prefácios. Ou seja: os de Brice Lalonde (ex-Ministro do Meio Ambiente da França) e Brune Poirson (ex-Secretário de Estado da Transição Ecológica da França). Em seguida, conheceu Danièle Kapel-Marcovici, CEO do Grupo RAJA, para lhe apresentar o livro e discutirem sobre o assunto. Uma coisa levou à outra e perceberam que as suas visões da embalagem e o seu futuro tinham muito em comum, e que já faziam isso. Então Danièle pediu-lhe para criar uma edição especial “RAJA” do livro, com um prefácio baseado nos 5 R’s da RAJA.
Em suma, a RAJA produziu esta edição, com uma introdução de Danièle, para explicar porque a empresa tem vindo a aderir à revolução da embalagem. Sobretudo, a RAJA já está envolvida na sua revolução há vários anos e está convencida de que esta revolução é indispensável e de que será um dos grandes impulsionadores. No final, dois destinos semelhantes acabam por se juntar.